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Racismo em Óbras Póstumas?


 

 

Raul Teixeira responde
Ano 5 - N° 220 - 31 de Julho de 2011
  
 
– Uma ação popular, baseada na existência de conteúdo racista no livro Obras Póstumas, de Allan Kardec, solicitou à justiça o recolhimento do citado livro. O magistrado que julgou a ação não acatou o pedido. Como se pode analisar essa e outras acusações de mesmo teor em textos kardequianos? 
Raul Teixeira: É uma consequência muito clara da deformação de muitas mentalidades, que saem das nossas escolas, das nossas universidades, e que passam a reger a vida coletiva, a vida social, ficando todos nós à mercê das suas incoerências e, às vezes, das suas inconsequências.
Na década de 1980, o notabilíssimo Paulo Freire, em seu livro Ação cultural para a liberdade e outros escritos, teve ocasião de apresentar um texto de grandíssima importância para a formação de qualquer intelectual: Considerações em torno do ato de estudar.
No referido texto, ensina Freire:
Estudar é, realmente, um trabalho difícil. Exige de quem o faz uma postura crítica, sistemática. Exige uma disciplina intelectual que não se ganha a não ser praticando-a.
E, mais adiante, explicita Paulo Freire:
O ato de estudar é o de assumir uma relação de diálogo com o autor do texto, cuja mediação se encontra nos temas de que ele trata. Esta relação dialógica implica na percepção do condicionamento histórico-sociológico (é meu o destaque) e ideológico do autor, nem sempre o mesmo do leitor.
Quando se sabe, pois, estudar, não se pode ler um texto de outra época, de outro contexto cultural e pessoas que também tinham liberdade de pensar – condicionamento histórico, sociológico e ideológico – como nosso gosto, nossa cultura ou ideologia atuais. Será necessário, a fim de entendê-lo em sua magnitude, identificar em que contexto foi elaborado, o que se passava em termos sociais, políticos, religiosos e econômicos, enfim, em sua contextualização histórica. É como quem estuda um osso, numa escavação arqueológica. Há que se encontrar tudo o que esteve em torno daquele fenômeno, a fim de que se lhe possa atribuir o valor a ou b. Sem esses cuidados tudo não passaria de uma aberração.
Para que alguma ação popular ou individual solicitasse à Justiça o recolhimento de qualquer texto espírita, teria que solicitar antes à mesma Justiça o recolhimento de todos os exemplares da Bíblia (nela o Senhor manda até que se exterminem povos os inimigos, os de outras etnias ou crenças... e tudo parece normal, aceitável e... divino); teriam que ser recolhidos as reedições deA República, do notável Platão, uma vez que para ele, à época, a escravidão era um direito do escravista, por isso normal, e assim por diante.
Bom é quando se encontra um magistrado que tenha tido boa escolaridade, que se preparou para a sua missão e por isso é dotado de bom-senso, sem o espírito seitista, sem parti pris, e que, assim, consegue dar bons desfechos a questões balofas, quanto é a de se desejar cassar qualquer literatura de outras épocas, de outras culturas e de autores que não são obrigados a pensar como nós.
Quanto aos espíritas, sinceros e honestos para com a Causa professada, cabe-nos cada vez mais e melhor estudar o Espiritismo, a fim de compreender o seu caráter univérsico, onde não se admite preconceito de nenhum modo, nem de credo, de etnia, de orientação sexual, de nível socioeconômico, menos ainda da cor da pele.
Vale considerar, por fim, que, sendo o livro Obras Póstumas, como o nome indica, publicado após a desencarnação de Allan Kardec, em 1890, tendo seus amigos reunido muitos textos que encontraram e os havendo publicado em nome do insigne falecido, quem pode garantir que tenha sido ele escrito pelo Codificador? Quem pode entender os motivos que levaram Kardec a não tê-lo publicado nem jamais haver tangido essa questão nas obras da Codificação Espírita?
De qualquer modo, propor o recolhimento de uma obra literária do séc. XIX, alegando algum conteúdo racista, como se pretendeu fazer com textos de Monteiro Lobato e do referido livro kardequiano, é, para dizer o mínimo, uma maldosa ingenuidade, num país com tantas e graves arbitrariedades sociais contra minorias, contra o que vemos muito poucas vozes se levantando para propor reformas ou cassações dos decretos ou das leis que lhes dão respaldo.
Quanto aos verdadeiros e valorosos espíritas, que avancem caminho afora, por meio de uma vida de dignidade e de alegria, certos de que, como asseverou o Espírito de Verdade a Allan Kardec, em O Livro dos Espíritos, perg. 798, sobre se o Espiritismo se tornaria crença comum:
Certamente que se tornará crença geral e marcará nova era na história da humanidade, porque está na natureza e chegou o tempo em que ocupará lugar entre os conhecimentos humanos. Terá, no entanto, que sustentar grandes lutas, mais contra o interesse do que contra a convicção, porquanto não há como dissimular a existência de pessoas interessadas em combatê-lo, umas por amor-próprio, outras por causas inteiramente materiais.

Entrevista concedida especialmente a esta revista em 29 de junho de 2011.

 

Fonte: O Semeador - FEESP
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